quarta-feira, 29 de julho de 2009

Carta de Orfeu a Eurídice



Aqui, é o centro. Onde a solidão me
impregna com o seu sudário de lodo, e a humidade dos fundos
desce pelos vidros da noite, apagando as imagens
amadas. No entanto, parto esses vidros para ver o que
ficou para trás: que alquimia de sensações corre ainda
por esses campos onde avançavas, com a falsa convicção
do amor, levando-me atrás de ti até ao limite
de onde não há regresso? Que abraço de corpos sobrevive
no chão seco de palavras, enquanto te levantas da memória,
e o teu rosto se ilumina por entre os brilhos da manhã?

Parece-me que é tarde para acertar as coisas
que deviam ter sido feitas: ajustar as peças do presente nessa mesa
onde se acumulavam copos e papéis; separar as questões que
os dedos escondiam das respostas que entravam pela boca
do desejo, até um êxtase de mãos e de olhos. Contei as queixas,
transformei-as na mais doce das celebrações, arrastei
o instante até à berma da eternidade: e trouxe de volta
a mais dolorosa das ilusões. De cada vez, porém, era
único esse tempo nascido de uma partilha de lugares; e
não dei pelo vento que soprava de dentro da vida, levando
em direcções diferentes os passos que nos juntavam.

O futuro pertence aos cegos da imaginação; as suas
paisagens estendem-se por esses caminhos que não voltaremos a
seguir, até aos arbustos do horizonte. Não ouço nenhuma voz
nos pórticos que se abriram para a mais efémera das alegrias -
que se confunde com um rosto incessante no interior
da alma, a pura inscrição do amor. Guardo-te aí, flor matinal,
esperando que a água da vida te refloresça, e uma nova
vibração te devolva à ilusão do presente. O centro é este: o lugar
do encontro, onde os deuses nos roubam ao acessório,
e um todo se fixa no que é aparente, e passa.


Nuno Júdice

domingo, 26 de julho de 2009



Partimos pelo mundo fora em busca dos nossos sonhos e ideias.
Muitas vezes colocamos nos lugares inacessíveis o que está ao alcance das mãos.
Quando descobrimos o erro, sentimos que perdemos tempo, buscando longe o que estava perto.
Culpamo-nos pelos passos errados, pela procura inútil, pelo desgosto que causamos.
Diz o mestre:
Embora o tesouro esteja enterrado em sua casa, você só irá descobri-lo quando se afastar.
Se Pedro não tivesse experimentado a dor da negação, não teria sido escolhido para chefe da igreja.
Se o filho pródigo não tivesse abandonado tudo, não seria recebido em festa pelo pai.

Existem certas coisas nas nossas vidas que têm um selo que diz:
" Você só irá entender o meu valor quando me perder - e me recuperar".
Não adianta querer encurtar esse caminho.

Paulo Coelho - Maktub

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Metade


Que a força do medo não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito, e a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que amo seja para sempre amada mesmo que distante
Porque metade de mim é partida, a outra metade é saudade.
Que as palavras que falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço, a outra metado é o que calo.
Que a minha vontade de ir embora se transforme na calma e paz que mereço
Que a tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que penso, a outra metade um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste
E o convívio comigo mesmo se torne o menos suportável
Que o espelho reflita meu rosto num doce sorriso que me lembre ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para fazer me aquietar o espírito
E que o seu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo, a outra metade é cansaço.
Que a arte me aponte uma resposta que ela mesma não saiba
E que ninguém a tente complicar, porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade de mim é plateia, a outra metade é canção.
Que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor, e a outra metade também.


Oswaldo Montenegro

Sonhos frustrados!




Estou de Volta!


Pois é, estou de volta!

Neste blogue colocarei poemas e textos de autores que aprecio, de pessoas amigas (que me autorizem a publicar o que escrevem) e ainda aqueles que vou encontrando pela net e que sejam do meu agrado.

Espero que sejam do vosso também!

Obrigada por me lerem!